19 de junho de 2011

Literatura: Falando sobre o “Apocalipse Motorizado”

Por: Airton Rener

Colocando a grande São Paulo como exemplo, a cada 6 horas alguém morre por causa de um “acidente” de trânsito. Quase uma guerra civil, esses dados nos mostram apenas as conseqüências diretas da nossa sociedade do automóvel, e nessa estatística não está incluída as conseqüências em longo prazo que prejudicam uma futura geração e que transformam a situação em algo IRREVERSÍVEL. Os veículos são responsáveis por 70% da poluição na cidade de São Paulo, e 7 a 10 pessoas morrem diariamente por causa da poluição, principalmente idosos e crianças. No entanto se você ama automotivos, “meu amigo”, pode parar por aqui, ou não.

Não é querendo ser ludista ou ativista, mas ultimamente tenho questionado muito o quanto nossa sociedade se transformou ou se transforma em CO2, até os cérebros das pessoas entraram em combustão. Foi por isso que pesquisei e encontrei o livro “Apocalipse Motorizado”. Com um título bem sugestivo e interessante, o livro é resultado de uma rica crítica anticarro que foi organizada por Nedd Ludd. A obra reúne diversos textos de caráter sócio-científico escrito por grandes pensadores e ativistas contemporâneos como o próprio Ned Ludd, Mr. Social Control, Ivan Illich, Caroline Granier, André Gorz e outros. O livro apresenta não apenas uma análise da insustentável organização de nosso atual sistema de transportes, mas também sugestões de como, na prática, se opor de maneira inteligente e criativa à ditadura do automóvel.

A obra faz uma abordagem em diversas perspectivas que se convergem em um mesmo ponto, são vários assuntos associadas ao carro, mas não necessariamente ao CARRO em si, mas ao uso particular do transporte. André Gorz, por exemplo, afirma em seu texto “A ideologia social do automóvel” que o grande problema do carro é de ser bens de “luxos”, ele faz uma comparação dos carros com as mansões a beira de praia que a partir que são popularizadas, ou melhor, democratizadas, acabam tornado o espaço em um grande problema estrutural, pois as áreas de beira mar são muito limitadas, e o que poderia ser local de “luxo” acaba se transformando em favela. É com essa idéia que faço uma associação com as “Autobahns”, termo alemão para designar as estradas de altas velocidades, ou melhor, “estradas de luxo”, onde desfilavam as famílias abastadas com os primeiros carros motorizados. Desfilar nas Autobahns era sinônimo de luxo, velocidade e liberdade. A banda eletrônica alemã Kraftwerk retratou bem essa temática em seu álbum “Autobahn” de 1974, com ironia ou não, as músicas desse álbum retratam uma verdadeira ilusão. Hoje, com a popularização dos veículos, as estradas podem até ser sinônimos de “mobilidade”, mas nunca de velocidade e muito menos liberdade, falo isso me referindo principalmente nos grandes centros urbanos, onde há os maiores índices de congestionamento.

Não sei se você já reparou nas campanhas publicitárias dos automóveis, se não reparou, observe, são lindas! Se você encontrar alguma, pelo menos uma propaganda que mostre algum congestionamento nela, comente aqui na postagem, você ganhará o livro. Você pode até encontrar, mas sabe o que eu quis dizer. As propagandas fascinam tanto que nos esquecemos da realidade, com facilidade de pagamento em até 666 vezes, o “pobre” se torna “rico” e esquece que fora de casa nos aguarda uma série de prejuízos, mas não somente o prejuízo financeiro, mas sim o de qualidade de vida. Buzinas, combustão, poluição e mortes! Por que nós somos escravos do carro e do trânsito? E o quê fazer?

Os textos exploram ao máximo essa pergunta. Uma delas como “A importância do carro para a economia moderna” aborda sobre a popularização do carro e sua importância econômica no pós-guerra. Com a política do Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) nos EUAs e o desenvolvimento do fordismo, aumentou-se o número de empregos, o poder de consumo dos operários e o acúmulo de capital pelas indústrias, principalmente as montadoras automobilísticas que dependiam de várias fontes primárias, principalmente o petróleo que até hoje é uma das Commodities mais cobiçadas no mercado global. A dependência da venda do carro na economia global é explicada pelo seguinte trecho: “A produção de um carro envolve uma grande gama de indústrias que vai desde a borracha, passando pelo aço, plástico, material elétrico, petróleo, junto com indústrias de apoio como as empreiteiras, a indústria da publicidade e financeira”. Ou seja, enquanto não houver mudança na base estrutural da economia moderna, o mercado “entupirá” cada vez mais carros na vida das pessoas.

Outro problema associado aos automóveis está ligado a ineficiência do transporte coletivo em muitos lugares do Brasil. O desconforto e a baixa demanda dos coletivos induzem as pessoas a utilizarem o transporte particular. O livro retrata o carro como uma propriedade privada que ocupa lugares públicos e transformam o carro, em espaço de alienação, segurança e isolamento. Na Alemanha nazista, assim que surgiu a famosa Volkswagen (carro do povo), os automóveis ficaram mais acessíveis o que provocou juntamente com a ruptura das comunidades operárias, uma nova forma de alienação e diminuição dos números de greves. Isso ocorreu devido à qualidade que os carros têm de isolar as pessoas e quebrar o contato social entre operários depois das jornadas.

O livro, com certeza, vai muito além do que foi refletido aqui e finaliza com soluções para evitar o uso do carro particular e nos sugere a espalhar essas idéias através de bicicletadas, massas críticas e outros meios que conduzem informações. Apocalipse Motorizado, sem dúvidas, deve ser referência para estudo em diversas instituições. Existe um ótimo site chamado “Apocalipse Motorizado” que contém um acervo de mídias a respespeito da anti-sociedade do automóvel, clique aqui para conferir!

Produzido por alunos de Audivisual do Centro Universitário Senac, o documentário "Entre Rios" de 2009 trás a tona a urbanização de São Paulo e suas consequências catastróficas que andam acontecendo, trazendo também uma análise sobre o urbanismo rodoviário que deu preferencia ao automóvel ao invés das pessoas e do meio ambiente. Hoje São Paulo paga por isso! Embora simples, é um excelente documentário, veja a seguir:



Filmes que vimos essa semana que você deveria ver, ou NÃO!

Por: Airton Rener e Lucas Sá

A Rainha
Vermelha Mata 7 Vezes - 1972 (Nota 5,5)
Dir: Emilio Miraglia
Este é mais um típico Giallo das terras italianas! A grande diferença deste em relação a outros é a forma como a assassina é tratada no roteiro. Suas aparições são bem claras e expositivas, nós vemos o seu rosto e seu corpo antes do grande final, fato que é quase anulado em outros filmes do gênero, como nos filmes do Dario Argento. O roteiro elaborado pelo próprio Emilio Miraglia cai na mesmice e nas reviravoltas desnecessárias, mas o que torna A Rainha Vermelha um filme agradável visualmente é sua fotografia excepcional, com belos planos das lindas mulheres e suas mortes, e, sobretudo a trilha sonora composta pelo grande Bruno Nicolai, que já trabalhou nas trilhas de Três Homens em Conflito e Por uns Dólares a Mais, ambos de Sergio Leone - Lucas Sá

Dzi Croquettes - 2009 (Nota 8,0)
Dir: Tatiana Issa e Raphael Alvarez
Documentário brasileiro mais premiado dos últimos anos. Ao qual revela a trajetória e vida da companhia de teatro Dzi Croquettes, que revolucionou as artes e a relação dos homens frente sua sexualidade. O longa se traduz na forma clássica do documentário, com depoimentos de pessoas ligadas aos 13 integrantes do grupo, entre elas Claudia Raia, Marília Pêra e Liza Minnelli, a musa do filme Cabaret, e com grande acervo de filmagens caseiras. Mas a visão que reina é a da diretora estreante Tatiana Issa que é filha do cenógrafo Américo Issa, que fazia a parte técnica do espetáculo da trupe. Tatiana imprime a realidade de sua infância em que viveu com os que chama de "seus palhacinhos" de forma sentimental. Dzi Croquettes e seus figurinos extravagantes que espalham alegria e críticas, sobretudo em relação às ditaduras, desde Hitler ao golpe Nacional de 1964. - Lucas Sá


Lixo Extraodin
ário - 2010 (Nota 10)
Dir: Lucy Walker
Esse você deve assistir. O documentário cumpre seu papel demonstrativo da realidade e vai além das expectativas. Vick Muniz, conceituado artista contemporâneo, vai até Rio de Janeiro pra fazer um projeto diferente, de não apenas fazer a obra de ARTE, mas sim de mudar a vida de pessoas através dela. O documentário nos emociona do inicio a fim sem a necessidade de apelos sonoros, as imagens e os depoimentos falam por se só. Sem mais nada a declarar, lixo extraordinário é um luxo! - Airton Rener




Lady Snowblood II - 1974
(Nota 4,0)
Dir: Toshiya Fujita
Este é o maior erro que já fizeram! A maldição da continuação... Lady Snowblood II é tudo o que o primeiro não queria ser, apenas um filme de samurai. Toda a parte visual e estilistica do anterior são abandonadas nesta segunda parte, que se limita a cenas de ação bobas e sem criatividade, exceto a cena inicial que é o único momento em que se tem uma breve ligação com a estética inicial. O gore e a violência é bem leve e acaba sendo sobreposta por diálogos enfadonhos, até Lady Snowblood, interpretada pela bela Meiko Kaji, fala em momentos errados, perdendo sua característica fria do primeiro filme, o silêncio. Calma! Ainda tem espaço para mais erros, a trilha tema do filme, "The Flower of Carnage", cantada pela própria Meiko Keji, é retirada! O que terá acontecido a Toshiya Fujita? - Lucas Sá

Mr. Holland: Adorável Professor - 1995 (Nota 3,0)
Dir: Stephen Herek
Um dos filmes que mais se apóiam na narrativa clássica do cinema biográfico. Mr. Holland é um exercício de como fazer um filme certinho em cada cena e em cada ação. A variação da narrativa não flui, os personagens são chatos, o próprio protagonista se torna um herói cansativo. A duração do filme é outro fator que o deixa sem expressão e ritmo, são 2 horas e 20 minutos que duram uma eternidade! As transições de tempo e idade do professor são as mais toscas possíveis, com imagens reais de acontecimentos marcantes de cada ano, nada original né? A única cena que me agradou foi a implementação de uma cena do filme The Rocky Horror Picture Show, em quase imperceptíveis 2 segundos. - Lucas Sá


V de Vingança - 2006
(Nota 9,0)
Dir: James McTeigue
De quadrinhos à sétima arte, V de vingança é um filme altamente ideológico no qual o nome se refere imediatamente ao “A” de Anarquia. É com essa temática que o filme retrata muito bem o quanto “O estado” reprime e prejudica seus submissos diante do “O Contrato Social”. De caráter motivador e revolucionário o longa apresenta vários ensinamentos do nosso herói “V”, como ele diz “Idéias não são só carne e osso. Idéias são aprova de balas”. - Airton Rener




Vênus Negra - 2
010 (Nota 8,0)
Dir: Abdellatif Kechiche
Aproveitando o Festival Varilux de Cinema Francês, acabei me surpreendendo com está maravilhosa obra. Se referindo tanto à estatueta de Vênus pré-histórica e à Vênus de Milo, o filme aborda a exploração e a sensualidade em seu mais alto nível animalesco. Yahima Torres interpreta Vênus de Hotento, uma afrodescendente desvinculada dos padrões estéticos da Europa do século XIX. Ela é ridicularizada até que descobrem sua verdadeira sensualidade. Vênus Negra é um show de orgulho e preconceito. - Airton Rener

15 de junho de 2011

Cinema - Bandeiras Verdes

Por: Rayssa Baldez

O documentário de 1987 produzido por Murilo Santos retrata os interiores maranhenses abordando o aspecto do latifundiário nas modificações das relações campesinatas. No caso muitas famílias que mantinham a agricultura de subsistência foram expulsas de suas habitações, por conta dos grileiros que se apropriam dessas terras com falsas escrituras.


Nesse sentido a visão geral do filme está voltada para as disputas pelas posses de terra entre os agricultores e os grileiros e na eventual desapropriação dessas áreas localizadas na chamada Pré-Amazônica (no caso o interior de Vargem Grande). Especificadamente se vê no documentário a migração dos nordestinos que passam pelo Maranhão e vão para o oeste. E aborda por meio de depoimentos de pessoas pertencentes ao grupo de agricultores o seu Domingos e a dona Rosa: as repressões, as violências dos grileiros e seus capangas; as dificuldades para trabalhar nessas áreas de mata fechada que são terras de matas virgens, livres e férteis, à beira de grandes rios, nos quais as populações campesinatas irão se readaptar e moldar seus modos de vida a essa nova realidade rural.

O olhar de Murilo Santos retrata a simplicidade e sabedoria popular do homem agricultor, que apesar de não ter uma formação educacional e um conhecimento aprofundado sobre as questões humanas, possuem entendimento sobre os conflitos existentes nessas regiões de Pré-Amazônica e tentam se posicionar contra as explorações e dominações dos grileiros. Seu eventual êxodo para as bandeiras verdes é no sentido de reconstruir sua agricultura de subsistência e poder viver o cotidiano de sua vida rural, sem ter que ceder a dominações e explorações decorrentes da apropriação de extensas áreas de terras as quais as famílias rurais ocupavam.

"A história de uma família que parte em busca de novas terras
para cultivar e morar no interior do Maranhão."

11 de junho de 2011

As Mulheres de John Waters...

Por: Lucas Sá

As mulheres de John Waters... Volumosas e coloridas. Com seus cabelos armados com laquê, maquiagens contrastantes e roupas coladas no melhor tecido poliéster com estamparia de onça, zebra, purpurina e lantejoulas, faz com que sejam as mais grotescas e pervertidas na vida pacata da cidadezinha norte-americana de Baltimore. Seriam homens ou mulheres? Lésbicas ou Homossexuais? Ou talvez... Travestis? Suas barrigas, peitos e cabelos são onde agarram suas forças corpulentas, que se enaltecem pelo o exagero. O exagero da forma e do lixo. John Waters e suas mulheres D-I-V-I-N-E-S!

"Olá, cinéfilos. Aqui é o Sr. Jag... Falando para vocês dos estúdios Dreamland.
Esta linda casa móvel que vocês estão vendo é o corente esconderijo
da notória beleza Divine. Considerada a pessoas mais
pervertida e nojenta do mundo!"

A ASSASSINA - Divine/Babs Johnson (Divine) em Pink Flamingos (1972)
A OVOCIDA - Edie (Edith Massey) em Pink Flamingos (1972)
A INVEJOSA - Connie Marble (Mink Stole) em Pink Flamingos (1972)A GO-GO-GIRL - Dawn Davenport (Divine) em Female Trouble (1974)A CRIADA - Grizelda Brown (Jean Hill) em Desperate Living (1977)

A LÉSBICA - Muffy St. Jacques (Liz Renay) em Desperate Living (1977)A FRACASSADA - Fancine (Divine) em Polyester (1981)A MÃE - Edna Turnblad (Divine) em Hairspray (1988)

A SERIAL KILLER - Beverly R. Sutphin (Kathleen Turner) em Mamãe é de Morte (1994)

A ESTRELA - Honey Whitlock (Melanie Griffith) em Cecil Bem Demente (2000)A PEITUDA - Caprice Stickles (Selma Blair) em Clube dos Pervertidos (2004)

8 de junho de 2011

Cinema - RUBBER

Por: Lucas Sá

o filme que vão ver hoje...

é uma homenagem à "nenhuma razão"

Quentin. Calma, não é o Tarantino. Esse é o nome do jovem diretor, Quentin Dupieux, que realizou o bizarro filme RUBBER. Um pneu assassino que por poderes telepáticos começa uma viagem por velhas estradas e campos quentes explodindo cabeças de quem invade o seu redondo caminho. Sinopse cordial para um filme que antes de ser visto poderia ser enquadrado nos clássicos trashs contemporâneos, como Run Bitch Run! e Nude Nuns with Big Guns, que embalados pelo o sucesso de Grindhouse (À Prova de Morte + Planeta Terror), tentam retomar o horror cru e despretensioso do velho cinema underground dos ano 70 e 80.

É inevitável a ligação do nome do filme e do próprio diretor ao cineasta Quentin Tarantino. O estilo está presente até mesmo no pôster do filme, que abusa de elementos dos filmes de horror trash, com marcas de dobras no suposto papel e cores sem saturação, algo bem similar as películas de 35mm e na maior parte 16mm usadas para filmar os filmes do período. Rubber foi exibido na Semana da Crítica do festival de Cannes em 2010 e por aqui foi exibido no Festival do Rio. Fato que pode ser visto como uma abertura do "mercado" cultural do cinema para com o gênero do horror\terror, assim como aconteceu com o filme Possuídos de William Friedkin. Mas ultrapassando essa análise rasa, Rubber adentrou por inúmeras mostras e festivais mais conceituais do chamado cinema de arte por seu argumento ofensivo e que surpreende o espectador que idealiza as ações decorrentes do filme pela sinopse chula e trash, que o longa propõe em uma embalagem de "cinema de sangue e violência - Por favor, divirta-se!".
A cena introdutória de Rubber se torna um elemento crucial para esse decaimento do pré-conceito do espectador perante o filme. Um carro da polícia e várias cadeiras são vistas em uma estrada de terra longe de cidades, o carro passa a andar por entre as cadeiras quebrado-as enquanto isso. O carro para, de dentro do porta-malas sai um oficial da polícia que começa a falar olhando fixamente para a câmera. É de certa forma um monólogo do filme com o espectador, onde ele idealiza o que iremos ver ao longo da projeção, comparando as várias ações e noções absurdas que o cinema nos impõe. Frases como: "No filme de Steven Spielberg, E.T., por que o extraterrestre é marrom?" ou "Pior! Em "O Pianista", de Polanski, como é que esse cara tem que se esconder e viver como um vagabundo... se toca piano tão bem?". Ao final de todas essas dúvidas o oficial responde repetidas vezes para cada uma delas com a seguinte frase: "Por razão nenhuma". Ao fim de seu monólogo, vemos que ele está falando não com nós, mas com uma platéia de mais ou menos 15 pessoas variadas no meio da estrada empoeirada, ao qual um capacho do oficial entrega para cada um binóculos para visualizarem o showbiz do cinema, no caso, um pneu que mata seguidamente todos ao seu redor, explodindo sua cabeças sem NENHUMA RAZÃO. Rubber pode ser resumido por essa pequena frase, "nenhuma razão", frase que fortifica seu argumento absurdo de assimilação natural. Mas a verdadeira intenção dessa introdução seria analisar a indústria hollywoodiana e suas fraudes de "nenhumas razões”.

A indústria comercial do cinema hollywoodiano é a preferida por grande parte das salas de cinemas, mas seus filmes que encantam os nossos olhos estão carregados de mentiras que somos coagidos a assimilá-las como verdadeiras no universo fílmico. Logo, qual seriam as críticas de um pneu que apenas cria vida e anda matando todo mundo? Como ele conseguiu esses duvidosos poderes? Como ele simplesmente é vivo? Não pense, só veja e relaxe. Argumento bem tradicional do cinema norte-americano não é mesmo? Deixar o absurdo ser acreditável. O grande poder do cinema, o de ilusão e devaneio mental de quem o vê. Rubber é intercalado entre cenas da saga sangrenta do pneu e dos espectadores que olham por meio de binóculos o filme, algo como um filme dentre de um filme, bem similar a idéia de Os Olhos da Cidade são Meus, de Bigas Luna. São nas cenas dos espectadores e seus binóculos que o filme conquista esse tom irônico e ofensivo em relação ao cinema. Esses espectadores reclamam do filme e até se coloca em nosso lugar, como se fosse a nossa própria reação em relação ao filme que estamos por ver. Logo quando o capacho entrega os binóculos uma jovem garota da pseudo-platéia o interroga, "Desculpe-me, o filme vai ser colorido ou preto e branco?". Em seguida um garoto de uns 12 anos afirma, "É chato!", e seu pai responde, "Não seja tão negativo. É só o começo. Vai melhorar. Seja paciente", o garoto responde ao pai, "Espero que não seja um velho filme mudo". Em seus primeiros minutos, o diretor francês Quentin Dupieux, nos coloca frente a um público preconceituoso e crítico sobre o cinema, é uma platéia que busca consumos rápidos e de entretenimento gratuito, algo como um passatempo. O filme que continua com um tom arrastado e silencioso começa a desagradar a platéia dos binóculos, que passam a dormir e se desinteressar pelo o filme, chegando a afirmarem que quando o filme estiver ficando "bom" o suficiente é para acordá-los. Esse desinteresse pela trama em instantes é motivo de grande fome, literalmente, do público, o filme está chato, sem ação, estamos com fome, fome de diversão. Eles passam horas sem comer, mas o capacho mata e assa um peru, que é jogado de forma rude por ele na areia para esses espectadores esfomeados, que o comem de forma grotesca, se assemelhando a zumbis. O tempo passa, o peru estava envenenado, os espectadores morrem, sobrando apenas um, o "esperto" da platéia. O peru envenenado e os zumbis esfomeados, metáfora visual brutal e interessante sobre a ridícula relação filme + espectador.

A reação da platéia e seus binóculos acaba se tornando mais interessante do que o próprio pneu malandro. A divisão no filme em sub-tramas imersas em um único longa é interessante e eficaz, o que pode agradar tanto o espectador que busca a diversão (o pneu e seus assassinatos), quando os que buscam uma análise mais aprofundada das ações e mensagens intrínsecas. Dando espaço até para a atual febre da pirataria, onde dois espectadores discutem por um deles está filmando com uma câmera digital as ações do pneu. Falando em digital, Rubber foi filmado nas famosas câmeras fotográficas da Canon, a 5D Mark II. Sendo essa forma de captação mais uma forma de analisar o "fazer cinema" nesse novo século, que inevitavelmente está substituindo o analógico cada vez mais pelo digital, por suas facilidades e menores custos. Claro, Rubber foi feito nesse suporte por ser um filme independente e de baixo custo, seria então a Canon 5D um novo 16 ou 8mm como no cinema marginal em que o filme foi baseado?

Ao fim de sua trajetória FAKE, Rubber encarna em um pneu de bicicleta, continuando sua jornada, agora em Hollywood Land! Mas dessa vez com centenas de "amigos" pneus...

"Provavelmente nunca haviam pensado, mas todos os grandes filmes, sem exceção, contêm um importante elemento de "nenhuma razão". E sabem por quê? Porque a própria vida está cheia de "nenhuma razão". Por que não podemos ver o ar ao nosso redor? Nenhuma razão. Por que estamos sempre pensando? Nenhuma razão. Por que algumas pessoas gostam de salsichas e outras odeiam? Por porra nenhuma de razão. Senhoras, senhores, o filme que vão ver hoje... é uma homenagem à "nenhuma razão".

5 de junho de 2011

O ocultismo de Aleister Crowley na cultura popular

Por: Airton Rener

Quem curte Ozzy Osbourne provavelmente já tenha escutado o clássico "Mr.Crowley" do álbum Blizzar of Ozzy de 1980. Mas, afinal, quem seria o tal de Mr. Crowley? Talvez seja essa a musica mais famosa e explicita a fazer claramente referencia a uma das personalidades mais inspiradoras no universo oculto na cultura popular, principalmente no Rock and roll. Edward Alexander Crowley, ou melhor, Aleister Crowley nasceu em Warwickshire, na Inglaterra em 1875. Veio de uma família abastada das mais puritanas seitas cristãs da época, chamada de Irmãos de Plymouth, que impunha uma doutrina religiosa o mais rigoroso possível.

A genialidade dele aflorou desde cedo. Aos 4 anos de idade já lia a Bíblia e aos 6 já era um excelente jogador de xadrez. Ainda pequeno aprendeu hebraico, grego e latim. E não demorou muito pra se interessar pelo ocultismo. Com 25 anos foi admitido na Ordem Hermética da Aurora Dourada (Golden Dawn), uma sociedade de culto e da Inglaterra, onde foi lá que iniciou diversas modalidades de ocultismo como magia cerimonial, cabala (Kabbalah), consagração de talismãs, invocação de espíritos, entre outras.

Ao decorrer de sua carreira, Aleister Crowley se tornava mais cético, criticava e apontava para religiosos varias incoerências bíblicas, aumentando assim, o seu repúdio pelos valores morais, doutrinários e manipuladores do cristianismo. Seus pensamentos se aliavam perfeitamente aos do proeminente filosofo alemão Friedrich Nietzsche, autor do clássico O Anticristo, obra publicada em 1895 que — diferente de que se pode imaginar — não se refere à figura bíblica 666, mas sim pela pessoa avessa as morais do cristianismo. Provavelmente, por esse motivo o anticristão Aleister Crowley se autodenominou como "A Grande Besta" causando polêmicas para sociedade reprimida do século XIX. Ele expressa seu ódio a Jesus Cristo em The World´s Tragedy (A Tragédia do Mundo):

"Não quero discutir as doutrinas de Jesus, elas e somente elas, degradaram o mundo à sua condição atual. Considero o cristianismo não somente a causa, mas também o sintoma da escravidão."

Numa época onde atos homossexuais eram considerados ilegais e punidos, Aleister Crowley era bissexual assumido e com uma atividade sexual vigorosa. Participou de orgias e teve atividades sexuais com homens e mulheres, tendo com os primeiros relações onde desempenhava o papel passivo durante o sexo anal. Aleister, sem dúvidas, era um jovem controverso. Foi considerado como o homem mais perverso do mundo e suas atitudes e seus pensamentos equipavam uma nova geração que estava por vim.

Crowley era um mago culto e satânico, escreveu varias prosas e poemas, sendo muitos de conteúdos pornográficos e outros de conteúdos revolucionários. Liber 333 (Livro das Mentiras) e Liber AL vel Legis (Livro da Lei) foram suas obras mais importantes e são até hoje muito procuradas, sendo a última considerada o texto sagrado de Thelema, uma doutrina ou filosofia religiosa difundida por ele em 1904. É no Livro da Lei que se encontra suas celebres frases "Faze o que tu queres será o todo da Lei" e "Amor é a lei, amor sob vontade". A primeira prega um dos principais fundamentos de Crowley que se refere a libertação daquilo que te impõe e te induz a fazer algo que seja contra tua vontade. A última frase é o slogan do movimento pacifista Flower Power pregado pelos Hippies dos anos 60 contra a Guerra do Vietnã.

Os Beatles sempre estiveram à frente de seu tempo. Foram eles os primeiros a citar Crowley na cultura popular. O disco Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967) embora não muito popular, é considerado como o álbum mais influente na historia do Rock, é na capa deste álbum que se encontra diversas imagens de personalidades influentes, incluindo o mago Aliester Crowley, como se pode observar ao lado. John Lennon, em uma entrevista, afirmou que "toda a idéia dos Beatles" era do famoso ensino 'Faça o que você quiser', de Crowley.

O guitarrista da banda britânica Led Zeppelin, Jimmy Page, fanático pelo mago, comprou a Abadia de Thelema, um castelo de Crowley. Logo depois desse evento, segundo boatos, surge o chamado "Maldição do Led Zeppelin” cuja frase se refere às tragédias acontecidas na banda no auge da carreira como a morte do filho do vocalista Robert Plant e a morte do baterista John Bonham que foi sufocado pelo próprio vomito. E sem que as pessoas que assistiam aos seus concertos soubessem, Jimmy Page realizava rituais aprendidos de Crowley durante algumas apresentações do Led Zeppelin.

O precursor do movimento Rock no Brasil, Raul Seixas, é outro crowliano, suas canções mais famosas "A lei", "Sociedade Alternativa", "Novo Aeon" e "Loteria de Babilônia" apresentam diretamente como referencia, Crowley e suas filosofias. Junto com Paulo Coelho, Raul pretendia criar a "Sociedade Alternativa", baseada no "Livro da Lei" de Aleister, onde "Faz o que tu queres, há de ser tudo da lei".

"-O número 666
Chama-se Aleister Crowley

"Viva! Viva!Viva! A Sociedade Alternativa"
-Faz o que tu queres
Há de
ser tudo da lei
"Viva! Viva!Viva! A Sociedade Alternativa"

-A Lei de Thelema
"Viva! Viva!"Tre
cho da letra "

[Sociedade Alternativa - Raul seixas]

O vocalista da banda The Doors, Jim Morrison, seguidor de Aleister Crowley, morreu misteriosamente em 1971, época em que ele estava no seu ápice do ocultismo. Segundo estudiosos da banda, Jim e sua noiva se casaram em uma cerimônia na religião Wicca, de pé sobre um pentagrama desenhado no chão e bebendo um o sangue do outro. Morrison admitia que Satanás fosse a fonte de sua música:

"Encontrei o Espírito da Música... Uma aparição do diabo em um canal de Veneza. Correndo, eu vi um Satã ou um Sátiro, movendo-se ao meu lado, uma sombra em carne da minha mente secreta..."

[The Lost Writings de Jim Morrison, pg 36-38]


Se tem uma personalidade tão "oculta" e tão influente na cultura popular, esse alguém com certeza seria Aleister Crowley. O tema sombrio de bruxaria e satanismo do Black Sabbath veio das idéias do nosso tão plausível mago. Há uma infinidade de bandas que seguem o pensamento crowliano como as mais famosas Rolling Stones e Iron Maiden. Até o inovador do rock dos anos 70, David Bowie, também teve influencias do pensamento liberal do mago nas suas composições. E não é por nada que a cantora excepcional Lady Gaga anda revolucionando o gênero tão banalizado POP adotando uma postura anticristã em diversas de suas apresentações, além de defender a liberdade no geral. Viva Crowley!

1 de junho de 2011

Releitura da cena do filme: Les Amours Imaginaires



Por: Lucas Sá

Vídeo de realização do exercício de regravação de uma cena de um longa já existente da matéria de Introdução a Linguagem. A cena escolhida (clique aqui para vê-la) foi a do filme Amores Imaginários do diretor canadense Xavier Dolan, este é seu segundo longa, sendo um dos concorrentes da mostra um Certo Olhar no Festival de Cannes. A cena em questão é a transição de vários planos até o encontro dos três personagens da narrativa, Marie (Angélica Yanez), Francis (Andruz Vianna) e Nicolas (Daniel Reigada). Marie e Francis estão se arrumando e se perfumando para se encontrarem com Nicolas, ao qual os dois estão apaixonados, mesmo sendo “aparentemente” amigos um do outro. Os planos usados por Xavir Dolan são postos na tela como uma forma de adoração da imagem, sua estética é extremamente detalhista se sobrepondo a narrativa em muitas das cenas de suas obras. São as cores, movimentos, cabelos e roupas que criam o universo do diretor, sempre preocupado na materialidade da imagem, na sua beleza visual.

Seus planos são enquadrados quase sempre em linha reta na visão do espectador, tornando as cenas de certo modo chapadas e secas na tela, típico do cinema independente atual, ou no uso de ângulos laterais que evidenciem o movimento corporal dos atores. No caso de Amores Imaginários a trama é sempre regada por grandes músicas dos anos 70 com o slow motion, como na cena escolhida, o que evidência ainda mais essa predileção para com a forma e o movimento do corpo como elemento revelador de sentimentos na narrativa. A cena de Maria fumando um cigarro na rua e a fumaça saindo de sua boca ou do beijo desprezivo de Marie em Francis são exemplos sublimes sobre a expressão e a dinâmica das coisas como forma de detalhes que se tornam elementares no andamento da trama. As roupas e cores são grande fonte de inspiração para o diretor, que sendo jovem, 21 anos, se apega a materialidade estética para impor suas emoções. Em várias cenas do longa a câmera é encaminhada para um detalhe do figurino do ator, além de suas cores representarem o caráter do personagem no momento, ou seja, construção de personagens a partir de matéria externa aos seus sentimentos. Em seu primeiro filme, Eu Matei Minha Mãe, é evidente essa questão formal da imagem, mas de forma mais sutil e invisível, a câmera se torna mais crua e realista, o que em Amores Imaginários é totalmente abolido, pois estamos imersos em mundo fantásticos de amantes francês apaixonados com suas roupas e cigarros com cores vibrantes. Nada mais prematuro e infantil para um jovem diretor.

Nossa recriação se baseou nesses objetos e figurinos representativos, que são o foco da cena escolhida. A exacerbação e o exagero da estética nos deram possibilidades de mobilizar e reverter várias cenas e planos. Tivemos a liberdade de incluir inúmeros detalhes que na cena original não eram evidenciados, posso afirmar até mesmo que nossa recriação seja um ‘’exagero do exagero” da estética já impregnada pelo diretor. Abaixo cenas que foram incluídas e suas motivação de inserção:

1- Close no olho de Marie: Nesse plano foi utilizado o elemento da filmadora ao qual o foco evidência objetos de pequenas dimensões, dando a eles mais detalhes e contraste. Esse plano foi elabora para propor uma maior rigidez da beleza na preparação de um encontro. Ela, para alguns, chega a ser irritante a agonizante pela proximidade do rímel no olho da atriz.

2- Perfil do rosto de Marie fumando: Essa cena no original é uma das mais belas da sequência, mas como a filmadora que utilizamos (Handycam Samsung) não é boa para pegar detalhes mínimos nos incluímos esse perfil da atriz com a fumaça saindo de sua boca para compensar essa falta técnica da filmadora.

3- Plano das pernas e saltos de Marie: Implementada para criar uma melhor valorização da roupa como linguagem cinematográfica. A rua e o salto. Essa cena foi colocada também por uma questão pessoal do diretor (Lucas Sá) da cena.

4- Close do rosto de Marie beijando Francis: Filmada para evidenciar a questão do desprezo mútuo de ambos os personagens.

5- Nicolas fazendo o sinal de três com os dedos: Plano que inicia o espectador para o desenrolar lúdico dos planos seguintes. O “três” evidência que o encontro não é só de duas pessoas apenas, mas sim de uma tríade que configura um triângulo amoroso. Transpondo assim, o sinal de “paz e amor” de Francis nos planos anterior em uma questão numeral.

6- A arma de dedos: Faz continuidade a brincadeira das mãos como expressão dos sentimentos, além de ser uma forma “imaginária” de vingança de Francis para com o seu amor imaginário. É interessante que até então a cena é realista na forma de expor as ações, mas a partir desse momento a narrativa se torna surrealista e fantasiosa, se assemelhando fisicamente a letra da trilha, a música Bang Bang da cantora Dalida.

7- Marie se assustando com o tiro: Plano que tem a intenção de colocar os sentimentos de Marie em primeiro plano. Ela cria também um breve sentimento de ansiedade e suspense no espectador.

8- Close da mão de Nicolas com sangue: Incluída para tornar verdadeira a possibilidade do tiro imaginário de Francis.

9- Nicolas com olhar assustado para Francis: Evidenciar a surpresa e os sentimentos de Nicolas no momento após o tiro.

10- Francis em Contra-plongée: A câmera é colocada de baixo para cima na intenção de criar um sentimento de grandiosidade na figura do personagem Francis. Uma forma de orgulho e louvação por seu ato macabro.

A sequência foi filmada com equipamentos do campus CA (Centro de Artes) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Sendo utilizado na gravação equipamentos como tripé e a filmadora Handycam da Samsung em mídia MiniDV. As locações foram em uma pensão de estudantes, nas ruas de Pelotas e na Doceria Márcia Aquino, tendo uma duração de quatro dias de filmagens em dias descontínuos. O figurino foi uma parceria entre o Brechó Veste Bem e com roupas dos próprios atores. A cena foi editada nos softwares After Effects e Sony Vegas 10 por Lucas M. Fernandes.

FICHA TÉCNICA
DIREÇÃO--------------------------------Lucas Sá
PRODUÇÃO--------Lucas Sá e Angélica Yanez
EDIÇÃO----------------------Lucas M. Fernandez
FIGURINO--------- Lucas Sá e AngélicA Yanez

ATORES
MARIE-----------------------Angélica Yanez
FRANCIS---------------------Andruz Vianna
NICOLAS---------------------Daniel Reigada

APOIO
Brechó Veste Bem
Doceria Márcia Aquino