31 de maio de 2012

Carta de Sobral - I Nossas Américas, Nossos Cinemas

Nós, reunidos em Sobral, Ceará, Brasil, de 23 a 26 de maio de 2012, no marco do primeiro “Nossas Américas, Nossos Cinemas”, participamos do primeiro encontro de jovens realizadores da América Latina e Caribe, unindo 16 nações, promovendo um intercâmbio entre gerações. Entendemos a juventude como um estado de espírito em luta, sem preconceitos e aberto e nos reconhecemos como povos irmãos.


Este encontro tem, como objetivo, refletir, compartilhar experiências dos realizadores audiovisuais e gerar ações sobre a linguagem audiovisual, a comunicação, com o fim de manter vivo um movimento integrador da nonossa “AbyaYala” (América Latina e Caribe).

Trabalhamos com as heranças milenárias herdadas dos povos originários, transmitida aos povos transplantados, brancos pobres e escravos africanos trazidos por barcos colonizadores, e reinventados pelos povos presentes neste encontro.

Reconhecendo e recusando a ditadura do mercado que oprime nossos povos e seus imaginários culturais, seguiremos os seguintes princípios:

1.       Considerando A “DECLARAÇAO UNIVERSAL SOBRE A DIVERSIDADE CULTURAL”, da UNESCO, entre outros instrumentos internacionais que garantem a identidade e diversidade cultural a partir da produção cultural, entendemos a realização audiovisual como um direito humano;

2.       Exigir e proteger a plena vigência do direito à linguagem cinematográfica e audiovisual dos nossos povos, promovendo legislações que o garantam a cada uma de nossas nações;

3.        Entendemos o audiovisual como um fato político e artístico de ressignificação e transformação sociocultural;

4.       Apoiar os direitos do público com base nos conceitos marcados pela Carta de Tabor (1987), criada pela FICC (Federação Internacional de Cineclubes), para a formação de públicos pela ação dos cineclubes e das salas de cinema cultural, também apoiando e difundindo o dia 10 de maio como o dia do público;

5.       Garantir a alfabetização e educação audiovisual dos nossos povos, na sua dimensão artística e política, encorajando a leitura crítica dos meios de comunicação;

6.       Exigir o direito a livre comunicação, informação, expressão e acesso aos meios audiovisuais para todos os povos da América Latina e do Caribe;

7.        Defender o espectro radioeletrônico e a internet como bens públicos comunitários com a finalidade de preservar o espaço da comunicação sem censuras, tendo como referência a “LEY DE MEDIOS Y SERVICIOS DE COMUNICACION AUDIOVISUAL”, da Argentina, e a nova “LEY DE TELECOMUNICACIONES”, da Bolívia. Também nos declaramos abertamente contra o projeto “ACTA”, a lei “SOPA” e qualquer outro ato que ameace a liberdade de expressão dos povos e nos propomos a fomentar o uso das licenças “creative commons” e bases operativas como o LINUX, e outros softwares livres;

8.       Acompanhar e estimular os processos já existentes na organização do setor audiovisual, que compartilhem os mesmos princípios levantados por essa Carta, e recomendar a sua criação a níveis locais, regionais e nacionais, onde não existam;

9.        Exigir dos Estados garantias constitucionais para os realizadores que sofrem perseguição e ameaças a sua integridade física e intelectual. Exigimos o tratamento especial diferenciado do realizador e realizadora audiovisual, da mesma forma que recebem os jornalistas com relação à proteção e reserva das suas fontes;

10.     Incrementar espaços e oportunidades de acesso à informação e capacitação integral, bem como tecnologias já existentes e por serem inventadas, com o fim de garantir o direito de produção e circulação do audiovisual dos povos da América Latina e do Caribe;

11.     Promover mecanismos de fomento, sustentabilidade e continuidade dos processos de produção audiovisual dos povos da América Latina e do Caribe;

12.    Promover a integração cultural latino-americana e caribenha, respeitando a nossa diversidade cultural com o fim de exercer um processo de compreensão de uma identidade comum;

13.    Fomentar o pensamento, trabalho e tomada de decisões de maneira coletiva, respeitando as particularidades e construindo nossos laços com base na transparência e horizontalidade;

14.    Estabelecer a regularidade e itinerância deste espaço, de caráter aberto em “AbyaYala”, com rotatividade dos representantes, que devem socializar localmente os debates levantados nos encontros;

15.    Instituímos a rede virtual como meio válido de vinculação e discussão;

16.     Defendemos a liberdade criativa de formatos e estéticas na linguagem audiovisual, respeitando e fomentando a diversidade dos imaginários culturais dos nossos povos e nações latino-americanos e caribenhos, não permitindo nenhuma hegemonia estética imposta;

17.    Promover a solidariedade, a cooperação e o trabalho associativo entre os nossos povos;

18.     Promover a produção audiovisual com atitude critica  e superadora sobre os nossos imaginários, realidades, histórias, espaços comuns, semelhanças e contradições;

19.    Gerar uma interação direta entre as produções audiovisuais e os públicos, por meio de todos os formatos e linguagens existentes e por serem criados;

20.    Fomentar o uso das línguas ancestrais dos povos originários, e dialetos da América Latina e do Caribe para ampla difusão dos conteúdos audiovisuais produzidos pelas comunidades, tendo como referência o artigo 16 da “Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas” e outros instrumentos internacionais;

21.    Convocar para este espaço as nações e povos hoje ausentes neste encontro, procurando a integração e representação de todos os povos e nações que habitam os países da América Latina e do Caribe;

22.     Reconhecer como válida a experiência e formação não-acadêmica, acreditando na importância dos conhecimentos vivenciais nas áreas não-pedagógicas;

23.     Fortalecer o eixo fundamental dos espaços de formação e capacitação acadêmicos e nãoacadêmicos, de realizadores audiovisuais, no exercício da memória e história de nossos povos;

24.    Cremos importante gerar o intercâmbio e distribuição de obras audiovisuais traduzidas nas línguas faladas no nosso continente. Nesse sentido, comprometemo-nos, de forma colaborativa, a traduzir, dublar e legendar as obras audiovisuais e documentos que produzirmos;

25.    Este processo não obedece a interesses político-partidários. Sendo este grupo multinacional, composto por diversos setores da sociedade civil, entidades governamentais, grupos prontos ao debate e à recomendação de propostas de políticas públicas para o audiovisual e à comunicação dos nossos povos.

Ações:

Decidimos pela criação de diversos grupos de trabalho responsáveis pelas seguintes ações:

Comunicação:
1.       Criação e manutenção de uma lista de comunicação via internet. O moderador da rede se alternará em cada um dos encontros;
2.       Criação de um Portal;
3. Criação de um boletim eletrônico mensal.

Intercâmbio e Residência Audiovisual:

1.       Formar um grupo de coordenadores, um em cada país, para o desenvolvimento desta experiência na América Latina e no Caribe, com o compromisso de criar uma lista de anfitriões e residentes;

2.       As modalidades de residência serão definidas pelas partes envolvidas caso a caso.

Declarações:

1.       Declaramos nosso apoio à promulgação da nova lei cinematográfica e audiovisual do Peru, por parte das instituições de que participamos neste encontro, e o faremos, formalmente, por meio de uma carta;

2.       Manifestamos o apoio à criação e aplicação das leis de cinema e audiovisual que estão sendo debatidas no Paraguai, atualmente em etapa de construção;

3.        Expressamos nossa preocupação e exigimos de nossos governos  cessar a guerra, o genocídio e a perseguição infligidos aos povos indígenas e afrodescendentes da Colômbia, e deter a onda de violência vivenciada em países como  México que limitam o livre desenvolvimento dos direitos a justiça e a comunicação democrática;

4.       Apoio à continuidade e permanência da Jornada de Cinema da Bahia, encontro que já tem 40 anos de atividades e que corre o risco de não se realizar este ano. Ressaltamos que, no seu contexto, nasceu a Lei do curta-metragem no Brasil e a Associação Brasileira de Documentaristas;

5.       Apoiamos a realização do encontro Cariri / Caribe;

6. Saudamos a designação de 2012 como “Ano Internacional da Comunicação Indígena” e a celebração do XI Festival de Cinema Indígena de cineastas dos povos originários, na Colômbia, em setembro deste ano;

7.        Expressamos nossa profunda preocupação diante do próximo Encontro de Desenvolvimento Sustentável Rio+20, diante da forma  autocrática como foi definida sua agenda em muitos casos, e diante do fato de os acordos tomados pelos presentes governos comprometerem gerações presente e futuras;

8.       Solidarizamo-nos com o fim do bloqueio a Cuba;

9.        No mês de novembro deste ano, realizaremos uma reunião na Tríplice-Fronteira, na cidade de Iguazú, Misiones, Argentina, com a finalidade de preparar o segundo encontro de Jovens Realizadores da América Latina e do Caribe, a ser realizado em 2013 no Peru.

Sobral, Ceará, Brasil, 26 de maio de 2012.
 
Nossas Américas, Nossos Cinemas 1º Encuentro de Jóvenes Realizadores de América Latina y Caribe



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