21 de julho de 2011

Cinema - Attenberg

Por: Lucas Sá
A beleza perfeita e idealizada dos corpos das
esculturas gregas encontra sua estranheza.
Durante os três últimos anos a Grécia vem se tornando um pólo sustentável e disseminador de excelentes filmes. Attenberg, que a pouco foi escolhido para representar seu país no Oscar 2012 e que ganhou o prêmio de melhor Atriz no Festival de Veneza em 2010 pela atuação da estreante Ariane Labed, com Tarantino na presidência do júri, se revela como um empreguinador de certas tendências temáticas e estéticas que anos antes já se permeava sobre o cinema grego. O de causar reações incógnitas e choques através de situações e ações estranhas por parte de seus personagens incompreendidos.

Este é o primeiro filme da diretora Athina Rachel Tsangari a ganhar reconhecimentos mais amplos, seu filme anterior, The Slow Business of Going, quase não se tem informações precisas ou até mesmo o seu trailer. Attenberg, bebe abruptamente da fonte de um dos filmes dessa tendência deste ano, Dentes Caninos. A todo o momento, durante a projeção, cenas e situações de Dente Canino adentravam ao meu pensamento, desde a minha primeira visualização da arte do cartaz até a cena final, eu não parava um minuto de relacioná-lo com o excelente Dente Canino. As disponibilizações dramáticas da protagonista e de sua amiga, são semelhantes ao estado emocional dos jovens que são presos em suas casas por seus pais desde o nascimento para não terem contato com a sociedade externa e mundana. Cenas como a dança de Marina no quarto do hospital onde seu pai está internado, faz uma intima ligação com a cena das duas irmãs e suas danças bizarras inspiradas pelo filme Dirty Dance, em Dente Canino. Até mesmo a mise en scene da câmera em relação ao espaço físico, comprova esta ligação conclusiva da nova "tendência" do cinema grego. E é nos créditos finais de Attenberg que me deparo com o nome de Giorgos Lanthimos, como um dos atores do filme, no caso, um homem com quem Marina tem suas primeiras experiências sexuais masculina. Lanthimos, que é nada mais do que o próprio diretor de Dente Canino! E foi pesquisando afundo que percebi que não existe só uma ponte estética de ambos os filmes, mas há também uma intimidade profissional, já que a diretora Athina Rachel Tsangari também foi uma das produtoras do filme de Lathimos, este que não só atua, mas também restabelece a parceria produzindo Attenberg. Logo, ambos formam um grupo de influências no mínimo esquisitas, com fortes influências do estilo fílmico do diretor austríaco Michael Heneke. Estaria nascendo um novo manifesto ou cinema de escola? A escola dos anos 2000? Grega?
Ao contrário de Dente Canino, o longa de Athina Rachel, não busca motivos racionais para explicar o comportamento e os sentimentos de sua protagonista, Marina (Ariane Labed). A cena inicial é um exemplo dessa brutalidade narrativa que permeia constantemente as cenas de seu filme. Uma parede branca com desgastes de tinta é enquadrada, duas moças aparecem, são Marina e sua amiga pervertida Bella, ambas iniciam um beijo com línguas desordenadas e lambidas desengonçadas, objetivo? Sabermos que Marina nunca obteve relações emocionais ou sexuais com qualquer humano, a não ser com sua amiga Bella, mas ai não é emocional, é apenas experimental e didático. Aprenda como beijar, aprenda como tocar, aprenda como chupar... Está é a única deixa que talvez seja a causa das possíveis atitudes esquizofrênicas de Marina, e esta não é nem de perto a causa mor de Attenberg, mas sim a relação da mulher com o sexo, com o homem e os membros carnudos de copulação. Marina e Bella formam um conjunto de idéias rebuscadas sobre o ato sexual e seus mistérios imbecis, ou tabus. Como a própria protagonista afirma: "Algumas coisas deveriam permanecer em tabu...”

Em Attenberg, a carga dramática não se apresenta nas palavras e nem nos diálogos, estes são curtos e objetivos. Ariane Labed interpreta Marina de maneira fria e inorgânica, suas feições faciais são estáticas e não demonstram sentimentos exarcerbados, até mesmo no ato sexual com o personagem de Lathimos. Assim, são os corpos e seus movimentos que atribuem aos personagens algo que não chega a serem emoções, mas sim caráter do mais sujo e animalesco possível. Athina Rachel estabelece no roteiro a constante relação do homem como animal, como mamífero selvagem, fato que é presenciado em inúmeras cenas, como segundos depois do beijo bizarro da cena inicial, onde as duas se tornam felinos (onças ou gatos?) e começam uma briga com rangidos e gritos selvagens. Fundindo o beijo e as ações felinas, Athina Rachel, consegue teorizar em imagens, todo o contexto de seu filme em apenas uma única cena de abertura, no caso, a relação da mulher com o sexo e o homem como animal amazônico. Poderia citar no mínimo mais cinco cenas em que Athina Rachel nos joga na cara essa relação selvagem, mas uma em especial me fez lembrar outro filme. A cena em questão é uma sequências do pai de Marina e a própria imitando vários animais enquanto assistem um documentário sobre gorilas na TV, do diretor David Attenborough, sendo este o motivo do título do filme. O filme que me recordo de ver algo parecido, pessoas imitando animais como ato sexual, é a clássica cena de Paul e Jeanne em O Último Tango Em Paris, do Bertolucci. Os corpos dançantes em Attenberg também podem se revelar importantes na trama, como nas constantes cenas de Marina e Bella dançando coreografias bizarras que intercalam uma cena a outra. Movimentos que me fazem recordar novamente a dança freak das duas irmãs em Dente Canino. Logo, o corpo e suas articulações falam mais do que a boca. É a palavra sendo contestada pela carne. Mas, mesmo a carne sendo o elemento principal para maiores atos dramáticos e explicativos, o rosto, que faz parte desses corpos, não entra neste contexto, já que em toda a projeção ele permanece intacto e rígido, não permitindo criar espaço para emoções passageiras e banais. Mesmo com a previsão de que seu pai vai morrer, fato que fica claro desde o princípio, sua relação é distante, com exceção de uma única cena, a final, onde Marina joga as cinzas de seu pai no mar. Seu rosto se desmorona por instantes, mas ainda sim continua intacto e extremamente frio.
O próprio pôster de divulgação do filme revela essa interação do cinema com o corpo. Na arte podem ser visualizados apenas os ombros da protagonista, em uma posição rígida e incomum. Mas seu rosto, "o cinema é dos rostos! Dos códigos do rosto...", como disse o diretor Peter Greenaway, Não aparece. Falando nisso, o pôster do filme foi minha principal motivação para vê-lo, é bastante instigativo e aguça a curiosidade de quem o vê. Este também teve forte ligação com a frase do Tarantino, quando o mesmo entregou o prêmio de Melhor Atriz em Veneza para Ariane Labed, ele disse: “Ficamos encantados pelo filme, que cresceu vagarosamente na nossa consciência. Não sabíamos que prêmio dar até começarmos a discutir melhor atriz. Aí ficou evidente que tinha de ser este, porque todo o filme é construído sobre seus ombros!”.

Outro elemento que ultrapassa a barreira do corpo são os objetos. A questão do sexo no contexto social é revertida em Attemberg para os objetos, uma relação de ambiguidade linguística e significativa. Como nas cenas de vários esguichos de água em jardins, que podem ser vistas como o sêmen masculino sendo arremessado pelo canal peniano. A água que rega e que permite disseminar as plantas ao seu redor se torna o sêmen, o elemento criador dos homens. Não é só aqui que o sexo está ligado a natureza. Em uma cena Marina corta pedaços de babosa e de dentro delas tira uma gosma semelhante a textura do sêmen masculino que em seguida a passa nas mãos de seu pai doente. Há também em um dos poucos diálogos longos do filme essa relação homem/natureza novamente, onde Bella afirma que sonha com árvores que os frutos que saem de seus galhos são pênis dos mais variados tipos. Mas em Attenberg, o que importa são os corpos!

- Algo como uma enorme pereira cheia de pênis...
Só que em vez de pêras, elas tinham pênis pendurados.
- Como assim?
- Grandes, pequenos, médios... Enrugados... Eretos, leitosos e suculentos. Alguns curvados à esquerda, alguns à direita, alguns com prepúcio, outros sem. Árvores com pênis. Árvores de pau!

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