27 de fevereiro de 2011

Cinema - Boogie Nights: Prazer Sem Limites

Por: Lucas Sá

Um dos trabalhos mais completos sobre os bastidores do mundo pornográfico sendo dirigido por um dos diretores mais complexos da atualidade, Paul Thomas Anderson. Boogie Nights é um trabalho provacativo para um diretor iniciante como Anderson, que até o momento só havia feito alguns curtas e um único filme. Mas é com Boogie Nights que o nome de Anderson passa a ser reconhecido pela indústria cinematográfica e se estabelece como um dos grandes nomes do cinema atual.

O filme narra o apogeu e declínio de um dos atores mas bem dotado, nos dois sentidos, do universo pornográfico. John Holmes, seu nome real, se tornou um grande ator de filmes adultos por seus nada mais nada menos 33 centímetros peniano! Fato que o consagrou como um "Porn Star" dos anos 70, quase que uma celebridade neste meio rabuscado. Em Boogie Nights, Paul Thomas Anderson absorve essa personalidade pornográfica e cria um roteiro que atravessa cada etapa de sua vida de forma alegórica. Anderson não segue detalhes de forma concreta aos acontecimentos verídicos de John Holmes, ele de certa forma usa da sua imagem para moldar seu roteiro a sua visão, tanto que o nome do personagem que faz Holmes é trocado, talvez por motivos pessoais, para Eddie Adams, interpretado exemplamente por Mark Wahlberg, que agora está fazendo sucesso no indicado ao Oscar, O Vencedor. O roteiro escrito por Anderson é produzido da forma mais clássica possível para contar dados biográficos: inicia com a descoberta, depois o sucesso e em seguida o declínio moral do personagem. Mas o que faz Boogie Nights se diferenciar deste gênero já degastado é forma como Anderson filma estas passagens de tempo e de mudança de caráter de Eddie Adams, que em certo momento passa a ser chamado pelo seu nome artístico, Dirk Diggler. Esse classicismo biográfico do roteiro sofre uma ruptura na medida em é inserido dramas de outras personalidades ligadas a Dirk Diggler, logo o filme não se centra apenas nas conquistas de seu protagonista, mas a todos os que estão ligados a sua pessoa. Nesse sentido, Anderson se apróxima de seu filme seguinte, Magnólia, onde os personagens estão ligados por um fio condutor, mas sendo que cada um tem seus momentos narrativos distintos. Em Boogie Nights essa característica é menos intensa, que de certo modo foi uma experimentação para Magnólia, sendo uma forma de se desapegar indiretamente aos desejos do protagonista e rondar os sentimentos e medos dos que estão próximos a ele, como o que ocorre com Amber Waves, personagem de Julianne Moore, onde ela perde a guarda de sua filha por conta de seu envolvimento com drogas e com a indústria pornô. Assim Anderson implementa várias subtramas que enriquecem a carga dramática, fazendo com que os figurantes não sejam "menores" do que o protagonista.

Em relação aos trabalhos seguintes de Paul Thomas Anderson, Boogie Nights é o seu filme menos conceitual. Magnólia e Sangue Negro são filmes que mantém uma linha mais realista e que se aproximam a algo mais intimistas, mesmo que esse realismo seja testado de forma excepcional em uma das sequências finais de Magnólia, a famosa chuva de... Boogie Nights talvez tenha sido menos introspectivo racionalmente devido ser um filme de iniciação de Anderson, logo ele se tornou mais aceito por parte do público e crítica, que elevaram o nome de Anderson ao estrelato, assim como seu protagonista, Dirk Diggler com seus centímetros de ouro. O ritmo fílmico é outro fator que o diferência dos demais filme de Anderson. Os cortes em Boogie Nights são acelerados e alegóricos, implementados por elementos dos anos 70, como placas em neon roxo e fotos em polaróides, mas nem sempre essa esquizofrenia na edição permanece, já que esses cortes rítmicos são alternados por longas cenas em plano sequência, sendo estas as mais belas do longa, exemplo disso, é a cena inicial, ao qual somos apresentados a uma grande placa de neon escrito "Boogie Nights", onde em seguida a câmera viaja pela rua escura e suja e logo adentra em um bar que toca "Disco Music" em alto volume, assim somos apresentados em uma única cena a quase todos os personagens da trama.

A representação de décadas anteriores é constantes nos filmes, mas poucos conseguem passar o espírito e a aurea real desses tempos. O que torna Boogie Nights mais agradável de ser visto sem se dar conta do cansaço de ficar sentado ao longo de duas horas e meia de projeção é justamente o seu visual. A estética usada para representar os anos 70, e o ínicio dos anos 80, é deslumbrante, fazendo com que o espectador se sinta imerso neste ambiente de calça boca de sino e de cores exuberantes a todo instante. O figurino é autêntico, nada muito gratuito como alguns filmes que se dizem se passar nos anos 70, como o ainda inédito, Take Me Home Tonight, pelo trailer do mesmo já se tem a noção de que o estilo da época não é respeitado, se tornando uma representação fajuta, que mixa o atual com o retrô, e que acaba confundindo os tempos. Uma das personagens de maior simbolismo deste período no longa é a Rollergirl ( Heather Graham ), que em todas as suas aparições está usando patins de quatro rodas acompanhados de curtos shorts jeans. Outro aspecto que fortalece este clima retrô é a trilha sonora. Poucas passagens em Boogie Nights utilizam do som de cena sem a auxilio da trilha, é ela que molda o ritmo do filme juntamente com os cortes acelerados, com músicas como, God Only Knows (The Beach Boys) e Best of My Love (The Emotions).

Além de ser um material interessante sobre os bastidores do universo pornográfico, Boogie Nights, acaba se tornando uma forma válida de analisar a relação do cinema com as novas tecnologias, como na passagem da película para o vídeo cassete, onde o mais barato se torna mais rentável, sobretudo no meio pormô, mesmo que este tenha menos qualidade estética.

* Outro filme que utiliza a vida de John Holmes como argumento fílmico é Wonderland. Nele a vida pornográfica de Holmes é deixada de lado para narrar o crime em que se envolveu quando passou a se viciar em drogas. Val Kilmer interpreta o astro pornô.


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